Três anos
Hoje passam três anos.
As datas, os calendários, os anos, os dias e tudo o que usamos para dar medida ao tempo, tudo isso pode ser invenção nossa, ilusão infantil de ter controlo no que não se controla, mas isso não apaga o facto de hoje se cumprirem três anos.
Há mil e noventa e cinco dias caiu-me um braço. E assim fiz estas três voltas ao sol, com um braço apenas, o outro perdeu-se numa guerra contra o destino, e homem que é homem aguenta-se só com um braço. Mesmo com nenhum, se os azares da vida assim o ditarem. Somos espécie que se adapta bem. Mesmo que tentemos, infrutíferamente, escapar ao abismo e, principalmente, à fragilidade da existência.
As mães não deviam desaparecer, assim como não devia acontecer muita coisa. É demasiado caos e aleatoriedade para alguém compreender. As mães, porventura, não deviam morrer, assim como o mundo devia viver em paz. Enquanto se puder escrever, todas as realidades são possíveis. A nossa imaginação é fértil, chegamos inclusivé a inventar anos para pôr em calendários. Saibamos aproveitar isso e saibamos, também, entender que, por mais mundos inventemos, o tempo não será nunca nosso. É isso que o mundo nos diz quando faz aquilo que faz todos os dias.
A minha mãe morreu há três anos. Tinha cinquenta e cinco anos. A vida dói, faz-se acontecer e não pede licença. Lidem vocês com isso porque eu desisti.
E dêem, sempre que podem, um beijinho à vossa mãe.